Facções criminosas atuam para interferir nas eleições em cidades do interior do Brasil

  • 11/05/2025
(Foto: Reprodução)
Segundo um relatório sigiloso sobre as eleições municipais de 2024 ao qual o Fantástico teve acesso, grupos criminosos tentaram interferir na campanha em pelo menos 42 cidades. Facções criminosas investem para controlar o poder político em pequenas cidades do Brasil Facções criminosas têm atuado para interferir no resultado das eleições em cidades do interior do Brasil. Foi o que aconteceu em João Dias, no Rio Grande do Norte. Um grupo que contava com traficantes internacionais ligados ao PCC executou o prefeito da cidade após uma briga pelo poder. A cidade de pouco mais de 2 mil habitantes estava em plena disputa eleitoral. O alvo de criminosos era Francisco Damião de Oliveira, conhecido como Marcelo, prefeito de João Dias. Ele e o pai foram assassinados em agosto do ano passado, durante a campanha para a reeleição de Marcelo. A execução foi o desfecho trágico de uma disputa pelo poder na cidade, que envolvia um acordo realizado para a eleição anterior e planejado por traficantes do PCC. Áudios mostram o que disse Francisco Deusamor Jácome, condenado por tráfico internacional e ligado a Marcola, o líder do PCC. "A gente fazendo um acordo desse com você aí. É uma coisa que dá para você se remediar pro resto da vida. Você vai sair de boa. Porque 230 eu dei para você pagar as suas contas. E agora eu vou lhe dar mais 500 mil reais. Pense por esse lado. É muito dinheiro." Na gravação, aparecem ofertas que teriam sido feitas a Marcelo antes da eleição para prefeito em 2020, quando a chapa do Progressistas trazia ele como prefeito e a irmã do traficante, Damária Jácome, como vice. "O futuro prefeito de João Dias, Marcelo Oliveira, e a minha irmã, Damária Jácome, a futura vice-prefeita de João Dias", diz Deusamor em um vídeo de campanha. Mesmo procurado pela Interpol, Deusamor fazia aparições na campanha. E ele não era o único da família envolvido em crimes. "Antes de 2019, quatro irmãos dessa família Jácome foram condenados por tráfico internacional de drogas", afirma Alex Wagner Alves Freire, delegado da Polícia Civil do Rio Grande do Norte. Facções criminosas investem para controlar o poder político em pequenas cidades do Brasil. Reprodução/TV Globo Tráfico e envolvimento com o PCC Segundo investigações, Deusamor e Leidjan Jácome estariam entre os principais traficantes do Nordeste, chegando a comercializar mais de R$ 30 milhões em maconha. Os outros dois irmãos são José Romeu Jácome e Samuel Jácome. "A família Jácome sempre teve histórico de envolvimento com o PCC", diz o delegado Carlos Michel Teixeira Fonseca, da Polícia Civil do RN. Os investigadores acreditam que o dinheiro oferecido por Deusamor seria para Marcelo renunciar à prefeitura. Foi o que aconteceu em junho de 2021, seis meses depois da posse. Quem assumiu foi a irmã de Deusamor, a vice-prefeita Damária Jácome. "Dedico esse dia aos meus sete irmãos, aos meus 7 irmãos, Francisco, Maria José, Samuel, Leidiane, Romeu, e de uma maneira mais especial ainda, aos meus dois irmãos, Deusamor e Leidjan", declarou, em discurso de posse. Segundo a polícia, mesmo antes da renúncia de Marcelo, os traficantes do PCC, Deusamor e Liedjan, seriam os verdadeiros gestores do município, como indica a transcrição de um discurso em que Damária afirma que os irmãos tinham idealizado os quatro anos da administração. "As prefeituras hoje recebem muitos valores, tanto de impostos municipais, mas principalmente de repasses de recursos federais", diz o delegado Alex Wagner Freire. A combinação de dinheiro e poder atrai facções criminosas. De acordo com o IBGE, a receita do município de João Dias foi de R$ 23 milhões em 2023. "A estratégia é tomar esse poder político em locais em que isso possa trazer algum tipo de proveito econômico. Então, se esse município tem algum interesse que possa repercutir nos lucros das facções, eles tentam se infiltrar também na política", afirma o secretário nacional de Segurança Pública, Mário Sarrubbo. Atuação das facções O Fantástico teve acesso a um relatório sigiloso feito pela Polícia Federal e promotores de todo o Brasil sobre as eleições municipais do ano passado. Facções criminosas tentaram interferir na campanha em, pelo menos, 42 cidades. Só no estado de São Paulo, o PCC teria investido R$ 8 bilhões no apoio a candidaturas. "Nós precisamos estar atentos a isso e estancar esses movimentos", declara Mário Sarrubbo. Facções criminosas tentaram, nas eleições de 2024, interferir na campanha em pelo menos 42 cidades, aponta relatório sigiloso da PF. Reprodução/TV Globo Em outubro de 2021, apenas dois meses depois de assumir, a então prefeita Damária Jácome decretou luto de três dias. O motivo? As mortes dos irmãos dela, Deusamor e Leidjan, na Bahia, durante confronto com a polícia. José Romeu Jácome foi preso na mesma operação. Já Samuel Jácome tinha sido capturado meses antes, e hoje está no presídio federal de segurança máxima de Porto Velho, em Rondônia. Damária perdeu o cargo em 2022, depois que uma decisão da Justiça revogou a renúncia e conduziu Marcelo de volta ao comando da prefeitura. "Marcelo dizia que ele era ameaçado pelos irmãos da Damária", afirma o delegado Alex Freire. "Ele começa a fornecer diversas informações e a ajudar órgãos policiais com as investigações a respeito da família Jácome", complementa o delegado delegado Carlos Fonseca. A suspeita é que ele tenha indicado o paradeiro dos irmãos Jácome que, na época, estavam foragidos. O clima era tenso na cidade, especialmente quando começou a campanha e Marcelo concorria novamente à prefeitura, pelo União Brasil. E, desta vez, contra Damária, que estava no Republicanos. "O pessoal do Jácome tinha esse grupo armado, e o prefeito Marcelo necessitou também de criar uma força nesse sentido", acrescenta o delgado Alex Freire. No ano passado, pouco antes do atentado que terminou com a morte de Marcelo e do pai dele, Damária disse que "o que vem por aí, talvez tenha gente que nem aguente". Detalhes do crime De acordo com a investigação, Damária e a irmã, Leidiane, vereadora de João Dias, teriam mandado contratar homens para matar o prefeito. Uma porteira dá acesso ao sítio que os executores usaram antes do atentado. As investigações apontam que eles chegaram ao local cerca de 10 dias antes do crime. Um vídeo, feito por um dos criminosos, foi gravado no sítio — que pertence à família Jácome. "É peça por todo canto. Ô, quadrilha cabulosa!", diz ele na gravação. "Eles encontraram dificuldades de executar o crime porque ou Marcelo estaria acompanhado de seu grupo armado que fazia a sua segurança pessoal, ou estaria na residência que também é uma fortaleza", diz o delegado Carlos Fonseca. Os mandantes chegaram a pensar em matar o prefeito durante um culto evangélico. "Nós é nessa vida doida, mas a gente é temente a Deus, você sabe disso, né? Aí, onde tá só o povo de Deus, eu não gosto de encostar pra fazer coisa errada, não." A execução aconteceu dias depois, quando Marcelo e o pai visitavam uma barbearia. Nove suspeitos pelo crime foram presos e quatro estão foragidos, inclusive Damária. A polícia segue nas buscas. A equipe do Fantástico tentou falar com a atual prefeita, Maria de Fátima Mesquita da Silva, do União Brasil, viúva do ex-prefeito assassinado, sem sucesso. Na manhã seguinte, o portão do prédio continuava trancado com cadeado, sem opções de deixar recado. Na véspera, surgiu um decreto assinado pela prefeita determinando que, na sexta-feira, não haveria atendimento ao público. Outro lado Em nota, a prefeitura afirma que a cidade passa por momentos de profunda intranquilidade e que tem procurado devolver a normalidade à cidade e a seus moradores. Na casa da família Jácome, a equipe do Fantástico também não encontrou ninguém. O advogado de defesa disse que não há provas da participação das irmãs Damária e Leidiane no crime, e que as duas deixaram João Dias porque foram ameaçadas de morte. No portão da mansão da família, muitas fotos. Registros de tempos em que eles tinham muita influência na vida local. "Com a ocupação de cargos importantes do poder político por essas facções, elas vão logicamente lavar dinheiro, vão desviar recursos que, em tese, seriam para a população carente, como é a cidade de João Dias", conclui o delegado Carlos Fonseca. Ouça os podcasts do Fantástico ISSO É FANTÁSTICO O podcast Isso É Fantástico está disponível no g1 e nos principais aplicativos de podcasts, trazendo grandes reportagens, investigações e histórias fascinantes em podcast com o selo de jornalismo do Fantástico: profundidade, contexto e informação. Siga, curta ou assine o Isso É Fantástico no seu tocador de podcasts favorito. Todo domingo tem um episódio novo. PRAZER, RENATA O podcast 'Prazer, Renata' está disponível no g1 e nos principais aplicativos de podcasts. Siga, assine e curta o 'Prazer, Renata' na sua plataforma preferida. BICHOS NA ESCUTA O podcast 'Bichos Na Escuta' está disponível no g1 e nos principais aplicativos de podcasts.

FONTE: https://g1.globo.com/fantastico/noticia/2025/05/11/faccoes-criminosas-atuam-para-interferir-nas-eleicoes-em-cidades-do-interior-do-brasil.ghtml


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